sábado, 9 de julho de 2011

RS: TEATRO DE HISTÓRIAS e boas estórias(por Júlio Conte/Ator, Diretor...)

Postado por Julio Conte às 09:14 0 comentários
sábado, 9 de julho de 2011
EM BUSCA DE UMA GENEALOGIA
EM BUSCA DE UMA GENEALOGIA

TEATRO GAUCHO NOS ANOS 80

Durante os anos oitenta a vida cultural gaúcha viveu um de seus momentos mais importante. A diáspora gaúcha foi a debandada dos artistas de teatro para o mercado profissional no Rio de Janeiro e em São Paulo no início da década de sessenta. A absoluta falta de estrutura profissional do estado foi a responsável pela partida dos nossos melhores artistas. A resultante é que o movimento teatral passou a se basear quase exclusivamente em remontagens de sucessos ocorridas no eixo. Os espetáculos mal acabados e sem qualidade técnica, eram, de fato, um pastiche do teatro paulista e carioca. O que colocava nosso teatro como uma filial do centro do país. Contra esta espécie de colonialismo interno, uma geração teve que se rebelar e entrar em cena.

A HORDA EM DIREÇÃO À SALGADO

Ao descontamento com o esvaziamento cultural originado pela diáspora gaúcha, veio associar‑se a restruturação da escola de Arte Dramática pela Reforma do Ensino e a censura sistemática. O resultado deixou o teatro gaúcho frente a dois polos. Entre este Portugal e Espanha representado de um lado pelo Grupo Província, arauto da vanguarda estética tendo como principal criador Luis Arthur Nunes ‑ ligado ao Departamento de Arte Dramática da UFRGS ‑ e por outro lado, o Teatro de Arena, reduto do teatro político comandado por Jairo de Andrade, se desenvolveu o enredo da história desses anos. Entre estes dois polos, surgiu um terceiro, nem da escola nem do Arena, mas que juntos acenderam o desejo de fazer teatro da geração 80.

A insatisfação frente a um país sob um regime autoritário e uma faculdade mutilada em seu melhores elementos, fez emergir nos alunos de vários cursos ‑ Medicina, Direito, Engenharia, Arquitetura ‑ um desejo de fazer teatro e interferir na pobre vida cultural porto-alegrense. O teatro parecia ser o lugar adequado para enfrentar as limitações do pensamento imposto pelo momento político e buscar, através do exercício teatral, a libertação ideológica e corporal. A horda de alunos classe média insatisfeitos, acalentando, mesmo sem saber, o sonho secreto do profissionalismo, subiu a Av. Salgado Filho em direção ao número trezentos e trinta e buscou um canal expressivo nas pequenas e mofadas salas do DAD, Departamento de Arte Dramática.

DO DAD AO CAD

O DAD era a modernização, via Reforma do Ensino, do antigo Centro de Arte Dramática, CAD, até então ligado a faculdade de Filosofia. Havia sido fundado por Rugero Jacobi, um dos grandes diretores italinos importados pelo TBC de São Paulo. O CAD, reduto cultural do final da década de cinquenta foi, durante os anos de ditadura, completamente dizimado por uma série de expurgos, inclusive do filósofo Gerd Bornhein. A censura ideológica vigente desde o golpe militar de sessenta e quatro e exacerbada com o AI‑5 acabou por tirar da faculdade as melhores cabeças. Mas um grupo de alunos de teatro resistiu, recusando‑se a fechar a escola acéfala e terminaram o ano cumprindo o currículo dando aula uns para os outros. Desta turma de alunos se formou o Grupo Província: Luis Arthur Nunes, Graça Nunes, Suzana Saldanha, Guto Pereira, contando ainda com o acréscimo permanente de Arines e Isabel Ibias e eventual de Carlos Carvalho e Ivo Bender.

A Escola permaneceu, apesar de relegada a terceiro ou quarto plano na hierarquia universitária, como um espaço de resistência e liberdade estética ao qual vieram se juntar Irene Brietske, que começou a lecionar teatro depois de estudar na América. Luis Paulo Vasconcelos veio do Rio de Janeiro e foi diretor do Instituto por alguns difíceis anos. E ainda seguiu tendo a presença de Maria Helena Lopes, sobrevivente dos expurgos.

Luis Arthur Nunes foi complementar a formação no EUA e anos depois voltou para Porto Alegre. Encenou vários espetáculos de vanguarda ‑ "DeColagem", "Sarau da 9 às 11", e "Love Love Love", provavelmente o primeiro grande sucesso de público do teatro gaúcho. Ao criar seus espetáculos a partir de roteiros próprios, Luis Arthur foi o primeiro a se

rebelar contra a ditadura da remontagem. Dessa forma inverteu o processo de colonização cultural e foi um tipo de pai simbólico da criação coletiva a partir de roteiro. Seguiu fiel a uma linha de esperimentação estética sempre ligado as vanguaradas mundiais.

Suzana Saldanha, estrela do Província, seguiu dando aulas até se transferir para o Rio de Janeiro onde trabalha como atriz, professora e diretora de atores.

Graça Nunes continua dando aula na escola. Arines e Isabel Ibias se dividem entre o magistério e a televisão. Guto Pereira teve uma carreira brilhante como ator e Carlos Carvalho com sua dramaturgia engajada influenciou uma geração de escritores. Ambos vieram a falacer no auge do processo criador.

Todos eles marcados, sem dúvida, por aqueles anos que teimosamente mantiveram aberta a escola. Insistiram e dessa maneira criaram e foram eles mesmos criados por ela. E para a história.

Da escola surgiram ainda alguns grupos, Teatro Novo, direção de Irene Britske, encenou o "O Casamento do Pequeno Burguês", de Bertold Brecht com alunos da escola e arrebatou o público e a crítica. Logo depois criou "Frank Frankestein" um espetáculo magnífico e segue como uma das mais competentes diretoras do teatro gaúcho.

Maria Helena Lopes, a partir de alunos, criou o Grupo Tear que tiveram as suas grandes encenações em "Os Reis Vagabundos", "Crônica da Cidade Pequena".

ARENA DE LUTA

O Teatro de Arena, no polo oposto, foi criado pelo ator e diretor Jairo de Andrade aos moldes do Teatro de Arena de São Paulo. Teatro engajado, durante muitos anos foi um palco de resistência política. Depois do fechamento por problemas financeiros, reabriu com a grande montagem do diretor espanhol José Luis Gomez, "Mockimpot". A verdade é que apesar do sucesso nacional de "Mockimpot", o Teatro de Arena ainda passava, no final dos anos 70, por uma crise financeira e tentava sobreviver criando a Sala Qorpo Santo. Era um incentivo ao teatro amador, ao mesmo tempo que reabria negociações com o Serviço Nacional de Teatro, o extinto SNT, para recebimento de verbas que possiblitariam a subsistência.

DO QORPO SANTO AO SCHOLL'S OUT

Asfixiado pelo economia sem subsidio, o Tetro de Arena deixava a cena gaúcha. Antes de apagar o refletor, porém, organizou um pequeno grupo amador, e transformou um depósito num teatro, criando a Sala Qorpo Santo. O projeto amador na Qorpo Santo se desenvolveu com um teste. Muitos dos futuros artistas de teatro de Porto Alegre compareceram. Feita a seleção foram encenadas três peças: "Um Edifício Chamado 200", "O Homem que Enganou o Diabo" e "Eles Não Usam Black‑tie". Para dirigir estes jovens atores foi requisitado o trabalho de diretores recém-saídos da escola: Carlos Cunha, Guto Hernadez e João Pedro Gil. A eles veio se reunir Luciano Alabarse criando o grupo Açores. Eles montaram um espetáculo que foi símbolo do momento: "A Lata de Lixo da História". Uma encenação irreverente, ousada, escrachada que atraiu o público jovem, sedento de um teatro que longe dos clichês e fórmulas prontas do teatrão, buscava uma linguagem nova para um público novo. "A Lata de Lixo" revelou Pedro Santos, Marco Sório, Marta Biavaschi, Angel Palomero que num racha do grupo Açores formaram o Grupo Vende‑se Sonhos.

Seguindo nessa genealogia dramática, sob a criatividade de Pedro Santos, fizeram um texto chamado "Scholl's Out" e a montagem é um verdadeiro divisor de águas. Tratava‑se de uma criação coletiva mesclado com altas doses de teatro improvisacional. Criaram o Teatro de Identificação onde, após uma longa estiagem havia na cena gaúcha espetáculo, texto, atores falando a língua de Porto Alegre. O texto, em especial, se firmou pela empatia e vitalidade. A encenação que mudou a história tinha a cara de Porto Alegre. O sucesso de crítica e o estouro de público marcou o Grupo Vende‑se Sonhos, neste momento já com Márcia do Canto e Xala Filipi complementado, com brilho, o elenco.

O Grupo Vende‑se Sonhos ainda participou do movimento do cinema gaúcho que revelou Nelso Nadotti, Giba Assis Brasil e Carlos Gerbase assim com teve participação no elenco do filme "Deu Prá Ti Anos 70" ‑ que marcou a carreira de Nei Lisboa.

O grupo que encenou ainda "Trena‑flor" e "Das Duas Uma" influenciou toda uma geração. A importância do Vende‑se Sonhos e de "School's Out" é imensa, porque fez crer que era possível fazer teatro em Porto Alegre, não nos moldes de filial mas de inventar um teatro próprio, com dramaturgia específica, atores competentes e um público cativo e preocupado em buscar um local para pensar a sua vida.

Da flor destes sonhos coletivos viriam surgir do Grupo Do Jeito que Dá e Balaio de Gatos. Mas antes Porto Alegre recebeu uma visita que entrou sem pedir licença, tomou conta da casa, mudou os móveis de lugar, acendeu as luzes e rugiu no centro da salar: "Trate‑me Leão" do Grupo Asdrubal Trouxe o Trombone.

O VENDAVAL ASDRUBAL

Assim como o teatro nacional, o gaúcho também foi agitado pelo vendaval chamado Asdrubal Trouxe o Trombone. Estiveram em Porto Alegre num momento em que se buscava novos ares e ministraram um curso antológico. Com Regina Casé e Luis Fernando Guimarães, Evandro Mesquita, Patrícia Travassos, dirigidos por Hamilton Vaz encontram nas cabeças efervescentes da horda, um campo fértil para suas ideias. Os exercícios propostos pelo grupo mexeram com a estrutura pensante. No lugar da técnica a emoção, no lugar do alheio o pessoal, no lugar da generalidade o específico, no lugar o universo a aldeia. Estas ideias mostravam a necessidade e o desejo de que a experiência pessoal fizesse parte do processo e do resultado estético. Como se, naqueles anos, o lugar certo para metabolizar a desestruturação ‑ já vigente do país ‑ tivesse no teatro sua enzima mais ativa. Uma espécie de tropismo imantou os jovens atores, diretores e autores gaúchos. O curso do Asdrubal fez com que se pensasse teatro para além dos clássicos e buscasse na empatia popular a emoção dramática. A forma para que tudo isso ocorresse era uma só: a criação coletiva.

CRIAÇÃO COLETIVA: O FASCÍNIO CONTRA O FASCISMO

A repressão política e o autoritarismo de Estado levou o país a uma pulverização do pensamento. A Reforma do Ensino acabou com as turmas nas Faculdades. O cerceamento da liberdade de organização dificultou os encontros, esfacelou os sindicatos. A arma possível para o enfrentamento desta desagregação social foi a criação coletiva. A participação equalitária de atores, diretores e autores no sistema financeiro cooperativado. A democratização das relações criativas pela supressão do poder absoluto do autor sobre o diretor e deste sobre o ator, se completava com a ascensão do teatro improvisacional no lugar do texto pronto. Enfim, a formação de grupos de teatro foi um exercício democrático, uma espécie de pré-estreia mental da abertura política, e teve o efeito prático de uma contrarreforma. Além disso, a vivência grupal era também um filho temporão do movimento hippie, um Woodstock atrasado que mantinha sua dose de fascínio.

O estilo debochado e informal do grupo carioca, Asdrubal Trouxe o Trombone, abriu as portas para o que estava latente. As idéias de criação coletiva solidificaram o Grupo Vende‑se Sonhos e iniciou a Cia Tragicômica Balaio de Gatos a partir dos participantes do curso.

BALAIO DE GATOS

Mas se por um lado o Vende‑se Sonhos se manteve fiel ao Asdrubal em forma e conteúdo, o Balaio de Gatos aproveitou a deixa para radicalizar. A vida não era apenas a matéria prima da qual se alimentava o teatro, mas o teatro, num estilo artaudiano, invadia as atitudes diárias, numa performance constante. A linguagem performática transpunha as portas do teatro e ganhava as ruas, abolindo a divisão palco/plateia. O texto curto, fragmentado, a citação de outras obras ‑ de desenhos animados até os clássicos ‑ a multiplicidade de estilos narrativos antecipava o pós‑moderno. O grupo apostava na estética e fugia do formalismo panfletário criando assim uma linguagem própria que depois de ser muito criticada, acabou sendo absorvida, em parte, por vários outros grupos. Desenvolveu a união entre a dança e o teatro, entre o movimento, o gesto e a palavra. Criou a "geometria" que consistia em executar gestos selecionados, repetidos, de caráter estético e desconectados da palavra. Notem bem que estávamos aí no início dos oitenta. Gerald Thomas não tinha chegado ao Brasil, e provavelmente, naquela hora, aguardava ansioso num hotelzinho de Paris por um telefonema de Samuel Becket, como de fato aconteceu.

A trilogia formada por "Abutres da Rebentação", "No Vale dos Pimentões" e a "A Bela e a Fera" representaram o melhor do processo criativo do Balaio. Mas só no final do grupo, no início dos 90, veio o reconhecimeto, um tanto tardio, quando Patsy Cecato, Renato Campão, Lila Vieira e Jaime Ratinecas encenaram "Perucas em Desfile".

O Balaio de Gatos como o 'enfant terrible' do teatro gaúcho arranhava a face da burguesia com suas garras felinas e paradoxalmente sonhava como estrelato.

DO JEITO QUE DEU

Por outro lado o Grupo Do Jeito Que Dá corria por fora. Surgido dentro do DAD com um trabalho despretensioso de Júlio Conte, "Não Pensa Muito Que Dói", devorou todos o principais prêmios daquele ano. A encenação fazia uma crítica da vida universitária e lançava um olhar amargo e lancinante sobre o fazer teatral no sul do Brasil. A premiação solidificou o grupo e no ano seguinte estouraram com o fenômeno "Bailei na Curva". Traçando a trajetória de uma geração que cresceu sob o silêncio do golpe militar, Bailei foi a voz rompendo a emoção. Aprofundou o tema da identificação, mesclou a sátira com o engajamento, a comédia com o drama, a gargalhada com a lágrima. Manteve a característica básica da improvisação, mas propôs uma estrutura dramática mais complexa, buscou à articulação do quotidiano com uma dramaturgia competente. "Bailei na Curva" foi de certa forma o clímax de um processo grupal, pois sintetizava os acertos formais de um geração através da criação coletiva e acrescentava à jovialidade da encenação a maturidade temática com um olhar crítico e emocionante sobre os anos da ditadura. Um misto de denúncia e descarga, o "Bailei" mostrava, ao mesmo tempo a criatura monstruosa de um sistema perveso e, de forma paradoxal, o criador sobrevivendo numa insistente esperança. A história não oficial do país tendo como narradores sete crianças, foi uma catarse coletiva. O maior público da história do teatro gaúcho de todos os tempos. Atingiu várias capitais, percorreu a maioria das cidades do interior do Rio Grande do Sul. Talvez tenha sido texto mais encenado no Brasil – quase uma montagem por estado ‑ nos anos que se sucederam. Foi montado no Rio de Janeiro, também dirigido por Júlio Conte, e recebeu o Troféu Melhores de 86, Prêmio Inacem‑Ministério da Cultura. O processo se invertia: estava chovendo para cima.

O Grupo Do Jeito Que Dá fugiu do semi‑profissionalismo vigente e buscou uma produtora de força nacional. A Opus Promoções, na figura de Geraldo Lopes encarnou o produtor sensato e sensível. O condutor seguro levou o produto até parâmetros de profissionalismo não alcançados até então.

O VELHO SONHO

A participação da Opus no cenário teatral constituiu o produtor e, com isso, configurou um mercado. O produtor competente e confiável, o produto desejado e um público ávido de um lugar para pensar coletivamente, fizeram, talvez, o momento mais intenso da vida teatral gaúcha dos últimos anos. Seguindo a trilha de "Bailei na Curva", a associação com a Opus proporcionou outro grande sucesso que foi "A Verdadeira História de Édipo Rei". Uma comédia debochada satirizava o mito do Édipo sob a luz da psicanálise. Um grupo de atores experientes, Gregos e Troianos, e uma direção brilhante de Oscar Simch, juntamente com a produção do Geraldo Lopes mantiveram o esquema profissional em andamento. "Passagem Para Java" de Élcio Rossini, participante bissexto do Balaio, veio completar a tríade de sucesso e a concretizar ‑ o que naquele momento parecia eterno ‑ o profissionalismo no teatro gaúcho.

DIVERSIDADE ESTÉTICA

Nestes últimos anos o teatro se caracterizou pela diversidade. O fim dos grupos sacramentaram o fim das criações coletivas ao mesmo tempo que marcaram a ascensão do diretor. Este assumiu em parte o papel do autor, escrevendo o texto ou roteiro. A ausência de produtores de ofício fez com que os diretores também tivessem que ocupar o lugar de produtor. Nesta tendência vários diretores, além dos já citados, firmaram seu trabalho. Patsy Cecato, depois do Balaio de Gatos dirigiu o sucesso "Escondida na Calcinha" e fez do show "Viva a Gorda" um fenômeno de massa. Confirmou seu pulso de diretora e demonstrou seu talento para a linha de entretenimento. Camilo de Lélis, um camaleão formal, tem no imaginário popular sua fonte de criação mais rica. "O Ferreiro e a Morte" e "Mácario, o Afortunado" marcaram um diretor criativo, com uma escrita própria, em busca de um teatro popular. Humberto Vieira que dirigiu "Viagem Ao Centro da Terra" e "Memory Motel", se impôs por uma teatro moderno de encenações bem acabadas. Miriam Amaral respresenta tendências ligadas as correntes alemãs, desenvolveu a estética pós‑moderna no nosso meio: "Hamlet Machine" e "Ana Stein Compra Uma Calça E Vai Jantar Comigo". Nestor Monastério, diretor argentino radicado, teve grande sucesso com "Bella Ciao", vem mantendo um grupo e um trabalho regular e competente.

NOVA DIÀSPORA

Ninguém podia imaginar o que estava ocorrendo quando a horda abandonou as faculdades regulares e buscou o teatro. Ninguém podia imaginar que o teatro estava sendo o canal preferido para a geração porto‑alegrense adquirir sua voz e sua vez. Não podemos duvidar, foram alguns dos anos mais criativos do teatro gaúcho. Mas o esgotamento estético das formas desenvolvidas naqueles anos ‑ em especial da criação coletiva ‑ era evidente e previsível. A forma e o conteúdo não se sustentavam mais e pediam um revisão. Não era mais possível imaginar o teatro sem um texto bem estruturado, nem uma dramaturgia sem personagens complexos. Se não se pode viver só com os clássicos, também não se pode viver sem eles.

Ao apogeu, na metade da década de oitenta, seguiu‑se uma série de pequenas falências. O teatro, como todos os movimentos artísticos, não iria ficar imune ao tempo. As mesma condições que levaram os atores da década de sessenta ‑ Paulo José, Walmor Chagas, Lilian Lemmertz, Paulo César Pereio ‑ para o Rio‑São Paulo voltaram a se impor. A desorganização estrutural dos teatros do município e do estado, a ausência de um projeto cultural ‑ que prevalce ainda hoje ‑ aliado uma burocracia política e patrulhamento estético, uma atuação confusa do sindicato, além, é claro, da falta crônica de casas de espetáculos, levou os homens e mulheres de teatro que se forjaram nestes anos, a uma nova diáspora. Não tão violenta, uma vez que por aqui, muitos ainda permanecem, mas igualmente danosa. O que mostra o quanto é difícil aprender com nossos erros e que a compulsão à repetição é uma lâmina mortal a nos cortar a alma. Se a arte é o pão do espírito, continuamos a ser uma sociedade em busca de uma solução para nossa fome endêmica.
Postado por Julio Conte às 16:53 0 comentários

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