quarta-feira, 30 de outubro de 2013

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Nunca é um acidente! Sobre o assassinato de Douglas e os protestos na zona norte de São Paulo

30/10/2013

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 “Porque você atirou em mim?” (Douglas, 1996-2013, negro, morador da periferia ZN-SP)

Minha cara autoridade, eu já não sei o que fazer com tanta violência eu sinto medo de viver, pois moro na favela e sou muito desrespeitado. A tristeza e alegria aqui caminha lado a lado. Eu faço uma oração para uma santa protetora, mas sou interrompido à tiros de metralhadora. Enquanto os ricos moram numa casa grande e bela, o pobre é humilhado, esculachado na favela”. ( trecho da música ‘Eu só quero é ser feliz’ de Cidinho e Doca)

A última semana de outubro iniciou com um velório com a participação de centenas de trabalhadores. Não era um velório de celebridade, muito menos de um músico ou jogador de futebol. Quem estava sendo velado era um adolescente morador da Zona Norte de São Paulo, Douglas Rodrigues. Um jovem de 17 anos que dividia seu tempo entre estudar e trabalhar em uma lanchonete. 

Até a manhã do dia 27, domingo, Douglas era um entre milhões de jovens que tinha a vida desapercebida e longe da atenção das pessoas. Mas algo mudou isso, uma tragédia que infelizmente é corriqueira na vida dos jovens que moram na periferia.

Douglas, junto com seu irmão de 13 anos, andava pela rua para comprar um equipamento para o carro. A polícia havia sido chamada para atender uma suposta ocorrência de perturbação de sossego. O jovem e seu irmão estavam passando em frente de um bar, quando a viatura da polícia parou, um tiro imediatamente disparou. 

A PM não abordou o jovem, não perguntou o que ele queria, ou até mesmo para onde iria. Optou em eliminar o jovem que estava apenas passeando com seu irmão mais novo, tratando-o como um perigoso criminoso, pois em São Paulo ser pobre e morador da periferia é um crime. 

Um crime contra a elite branca, que odeia os legítimos eventos culturais da favela, que odeia o hip hop e o funk, que criminaliza os músicos (como no caso Dj Lah e Mc DaLeste que foram covardemente mortos), em resumo, odeia que os trabalhadores tenham qualquer espaço cultural para se distraírem da exploração e opressão que os ricos os submetem todos os dias.

A mesma elite branca que cobra e sustenta essa política de segurança pública da PM, é a mesma que para com seus carros importados na Paulista com sons altos. Com certeza policial nenhum dispararia um tiro “por acidente” em um filho de desembargador ou empresário. A justificativa da PM é que as festas na periferia causam transtornos à comunidade, mas ai uma pergunta a PM e a elite racista: estádios superfaturados que foram construídos em cima de barracos de milhares de famílias pobres também não é um transtorno?

A periferia nunca dormiu pois sempre sangrou

Os moradores da Vila Medeiros, Zona Norte, vizinhos de Douglas, logo se enfureceram com o assassinato. Não somente pelo fato de conhecer Douglas desde pequeno, de ele estudar e trabalhar, mas também pelo fato de ele ser mais um jovem, que como seus filhos, teve negado o direito de viver. 

Após o velório, toda a comunidade se levantou contra o Estado. Cansados de verem seus filhos mortos e seus algozes saírem impunes com a justificativa de que “foi um acidente”, trabalhadores e trabalhadoras tomaram as ruas fechando a Fernão Dias. Utilizando legitimamente o que de mais forte eles tinham, sua capacidade de lutar. 

A imprensa, como de praxe, logo tentou criminalizar a luta deles se referindo à mobilização como “bandidos invadem a via”, “vândalos queimam ônibus”, mas omitem em dizer que Douglas é mais um jovem que foi brutalmente assassinado. Que assim como Roberto, Dj Lah, Mc DaLeste e Amarildo, Douglas representa o destino de muitos trabalhadores que perdem ainda quando novos a perspectiva de viver. 

O que os trabalhadores da Zona Norte fizeram é o maior exemplo de descontentamento da ausência de políticas sociais à população pobre, que bastou apenas uma gota de água para transbordar o enorme balde da desigualdade que os governos municipais, estaduais e federal entregam aos trabalhadores.

Portanto, cobramos desses governos do PSDB, da Secretária de Segurança Pública de SP e do governo do PT, a resposta para a pergunta feita por Douglas no momento de sua morte, e não iremos nos calar até que essa pergunta seja respondida.

Enquanto o sangue dos filhos dos trabalhadores jorram…

Na semana passada o prefeito Haddad (PT) inaugurou o projeto do governo federal chamado “Juventude Viva”, que vagamente no papel buscaria combater o racismo e prevenir a violência contra a juventude negra das periferias. 

O projeto contará com o irrisório valor de R$ 162 milhões de reais para combater o racismo e a violência policial. Curiosamente, a mesma região que foi inaugurado o projeto em São Paulo, Campo Limpo (Zona Sul), teve na última gestão (Kassab) um dos maiores pólos culturais fechado, o Sarau do Binho. A mesma prefeitura que diz que fará “esforços” para utilizar o dinheiro do “Juventude Viva”, é a mesma que não se propõem em autorizar a reabertura do Sarau do Binho; é a mesma que não destina um centavo se quer na reforma dos pouquíssimos espaços de lazer da comunidade, como no caso a Praça do Campo Limpo, que há anos tem o bowl (pista de skate em formato de piscinão) em estado precário. 

Todos nós sabemos que há uma enorme diferença nas promessas do governo e a realidade. A mesma prefeitura que lança o “Juventude Viva”, tendo a Zona Sul como laboratório, é a mesma que corta dinheiro para a educação municipal, prejudicando diretamente os filhos da classe trabalhadora; é a mesma que recentemente cortou 20% em investimentos públicos à população, e mais, já anunciou a retirada de cerca de 400 linhas de ônibus até o final de seu mandato, o que prejudicará milhares de trabalhadores.

Alckmin (PSDB) também não se isenta dos ataques aos trabalhadores. Sua polícia há anos vem matando pobre e preto nas favelas. A solução encontrada pelo governo tucano para os problemas de ausência de moradia, educação, saúde e transporte é mandar a PM ir para cima dos manifestantes: jogando balas de borracha no centro da cidade, e depois da ponte, balas de aço nos peitos da juventude pobre. Em um país onde um jovem negro tem 139% mais chances de ser morto,denunciar o papel ativo do governo do PSDB para o aumento dessa cifra em SP é tarefa de todo o movimento social.

Pelo direito de viver é necessário sempre lutar

Nós, do Quilombo Raça e Classe, reivindicamos a luta dos trabalhadores e trabalhadoras da Zona Norte, que, cansados do descaso das autoridades, decidiram tomar as ruas como sua principal ferramenta de denúncia ao genocídio à juventude pobre e preta. A luta, como a história da classe trabalhadora sempre mostrou, é nosso maior direito. Direito que nenhum Estado e PM pode ousar tirar. 

Já está mais do que comprovada a falência da instituição policial na proteção e na segurança da população. Nas comunidades e favelas polícia é sinônimo de violência, assim como o crime organizado. Exigimos dos governos e autoridades policiais a discussão sobre uma outra política de segurança pública, com  a desmilitarização da polícia militar e fim da tropa de choque. 

Se o papel da polícia é servir e proteger a população, no caso os trabalhadores e os pobres que vivem também a tormenta do crime organizado nas comunidade, que sejam eles os responsáveis por elaborar as políticas de segurança pública, construindo uma nova polícia controlada e eleita democraticamente pelas comunidades. Douglas não foi o primeiro a ser morto pela polícia, mas queremos que seja o último; e que todos os responsáveis pelo seu assassinato sejam presos.

-Somos todos Douglas!Nenhum Amarildo, a mais! Não iremos nos calar!
-Contra o genocídio da população negra e pobre!
-Por uma outra política de segurança pública. Desmilitarização da PM, já!
- Fora Alckmin, leve o Grella com você!
- Dilma e Haddad, o silêncio também mata! Exigimos aplicação e ampliação dos recursos do programa “Juventude Viva”. Pelo fim da operação delegada

Por Edu H. Silva, do Quilombo Raça e Classe SP

Arte manchete: retirada do facebook Mães de Maio



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